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quinta-feira, 24 de março de 2011

Oi, eu vou ali morrer e já volto




Oi, eu vou ali morrer e já volto

Por: Geraldo TITE Simões
09/03/2011

http://www.motonauta.com.br/?p=17974&cpage=1#comment-1694

De uns tempos pra cá me transformei naquilo que os jornalistas chamam
de "fonte", um sujeito que tem as respostas para determinadas
perguntas. Minha especialidade com segurança de motociclista se tornou
uma fonte para colegas da imprensa. Dias atrás recebi a ligação de uma
jornalista de um grande veículo de comunicação (prefiro omitir nomes).
A pergunta veio em uma semana especialmente dramática para os
paulistanos, porque foram dois acidentes fatais por dia, engrossando
as estatísticas macabras. Ela perguntou:

- Por que morrem tantos motociclistas? (ou algo parecido com isso)

Antes de responder pensei naquelas centenas de vezes que discursei
sobre a educação de trânsito, fiscalização, faixas segregadas, falta
de formação, baixo nível de escolaridade das vítimas etc etc e mais
etc!

Só que cansei de divagar sobre esse assunto e dei a resposta que
sempre quis, mas nunca tive coragem:
- Morrem porque querem!

Diante do susto natural da jornalista, repeti a resposta e ela
reforçou que seria uma matéria publicada, se eu não queria rever a
resposta. Respondi que não, que poderia deixar inclusive entre
parênteses, citando meu nome como fonte, tipo:
O jornalista e instrutor Geraldo Simões, 51 anos, afirmou à reportagem
que os motociclistas de São Paulo morrem "porque querem".

Bom, a matéria saiu sem a minha declaração… porque a coragem que tive
para assumir aquilo que autoridades tentam disfarçar, a colega não
teve para publicar. Assim, as argumentações foram todas aquelas que
todo mundo sabe na ponta da língua, mas que são todas um enorme
disfarce para a mais óbvia das realidades: estes motociclistas morrem
porque querem e ponto final.

Claro que há os acidentes, que devem ser classificados como tal quando
nenhum dos agentes envolvidos teve a intenção de provocar. Mas
acidentes são raros em São Paulo. O mais comum é a mais elementar das
causas: a negligência, associada à prepotência, atributos de
personalidade que imperam nos motoristas e motociclistas de SP. Se há
negligência está clara a intenção por trás da ação.

Ah, mas o motorista mudou de faixa sem olhar! Sim, mas o motociclista
estava rodando a 90 km/h no corredor com uma moto sem freio, com pneus
carecas e de capacete desafivelado. Isto pode ser caracterizado como
acidente? O choque talvez, mas a conseqüência não! O choque foi um
acidente, mas o óbito foi causado por pura negligência.

Diariamente eu levo fechadas de motoristas nas mais criativas
variações. Tem fechada pela esquerda, pela direita e até dos dois
lados ao mesmo tempo. Só que rodo a uma velocidade compatível com os
outros veículos, minha moto tem freios eficientes e pneus novos.
Porque eu não quero me estabacar! E se cair meu capacete é novo, meu
casaco é estruturado e uso calça com reforço.

Non ducor, duco

O lema da cidade de São Paulo expressa uma atitude tão tipicamente de
motociclistas e motoristas paulistanos que soa como profecia. Não sou
conduzido, conduzo! Ninguém me diz onde, nem como devo conduzir, mas
conduzo à minha maneira, sem regras, sem sensatez, nem ordem. Minha
lei é meu umbigo!

Com raríssimas exceções – mas bota raro nisso, tipo que precisa lente
de aumento pra encontrar – a vítima fatal de um acidente de moto foi
totalmente inocente. Casos como linha de pipa com cerol, caminhão sem
freio na descida, bêbado que fura o semáforo são raros, mas adquirem
muito destaque pelo dolo envolvido.

Só que os acidentes fatais que são contabilizados – e que vejo, porque
estou diariamente nas ruas – são provocados por absoluta negligência
do motociclista. Daí meu desabafo do "morre porque quer!". Porque quer
rodar no corredor a 90 km/h. Porque quer rodar com pneu careca. Porque
quer usar um capacete de R$ 50 desafivelado. Porque quer rodar na
calçada a 50 km/h. Porque quer pular o canteiro central de uma grande
avenida.

Resumindo, morrem porque querem!
Soma-se esta conduta ao triste fato de as vítimas fatais se
encontrarem na maioria entre 18 e 25 anos e temos mais uma trágica
coincidência estatística. A adolescência, período que vai dos 12 aos
18 anos tem como característica a prepotência, comportamento que faz o
indivíduo acreditar que as coisas ruins só acontecem com os outros.
Como a maioria das vítimas são do sexo masculino e a adolescência do
homem vai até os 25 anos (ou 50, segundo as mulheres!), isso explica
boa parte destas vítimas.

Basta conferir qual a idade de alistamento militar para entender como
o Estado pode aproveitar a prepotência a seu favor. Na faixa dos 18
aos 25 anos o soldado vai pro front achando que nada de ruim vai
acontecer com ele, até um projétil .50 atravessar o cabeção.

Portanto, temos a fórmula ideal para que tudo de errado dê certo:
sensação de prepotência + negligência = morte súbita!

Ou seja, morrem porque querem!

E querem saber? Não há a menor chance de esta situação melhorar. Pelo
contrário, a tendência é piorar com a entrada cada vez maior de novos
motociclistas. Mas também não pense que esta situação é limitada aos
motoboys ou fretista.

É bom esclarecer que existem os motoboys e existe o comportamento
motoboy. O que os especialistas chamam de arquétipo, uma repetição do
mesmo comportamento. Tem donos de motos esportivas, BMW caríssimas que
agem da mesma forma e que depois de um acidente fatal é transformado
em vítima.

Os rachas na estrada, os atalhos pela calçada, a alta velocidade nos
corredores mostram que os "playboys" também morrem porque querem!

Responda sinceramente: se fosse chamado pelas forças armadas para
defender seu país do front de batalha, de fuzil na mão você iria? Eu
não! Não quero morrer tão cedo nem entrar no fogo cruzado! Por isso
não existe exército de soldados quarentões. A gente sabe que as coisas
ruins também acontecem conosco!

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