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O MARTÍRIO DE TIRADENTES, UMA FARSA CRIADA POR LÍDERES DA INCONFIDÊNCIA MINEIRA
Guilhobel A. Camargo
Ele estava muito bem vivo, um ano depois, em Paris. O feriado de 21 de
abril é fruto de uma história fabricada que criou Tiradentes como bode
expiatório, que levaria a culpa pelo movimento da Inconfidência
Mineira. Quem morreu no lugar dele foi um ladrão chamado Isidro
Gouveia.
A mentira que criou o feriado de 21 de abril é: Tiradentes foi
sentenciado à morte e foi enforcado no dia 21 de abril de 1792, no Rio
de Janeiro, no local chamado Campo da Lampadosa, que hoje é conhecido
como a Praça Tiradentes. Com a Proclamação da República, precisava ser
criada uma nova identidade nacional. Pensou-se em eternizar Marechal
Deodoro, mas o escolhido foi Tiradentes. Ele era de Minas Gerais,
estado que tinha na época a maior força republicana e era um polo
comercial muito forte. Jogaram ao povo uma imagem de Tiradentes
parecida com a de Cristo e era o que bastava: um "Cristo da Multidão".
Transformaram-no em herói nacional cuja figura e história "construída"
agradava tanto à elite quanto ao povo.
A vida dele em poucas palavras: Tiradentes nasceu em 1746 na Fazenda
do Pombal, entre São José e São João Del Rei (MG). Era filho de um
pequeno fazendeiro. Ficou órfão de mãe aos nove anos e perdeu o pai
aos 11. Não chegou a concluir o curso primário. Foi morar com seu
padrinho, Sebastião Ferreira Dantas, um cirurgião que lhe deu
ensinamentos de Medicina e Odontologia. Ainda jovem, ficou conhecido
pela habilidade com que arrancava os dentes estragados das pessoas.
Daí veio o apelido de Tira-dentes. Em 1780, tornou-se um soldado e, um
ano à frente, foi promovido a alferes. Nesta mesma época, envolveu-se
na Inconfidência Mineira contra a Coroa portuguesa, que explorava o
ouro encontrado em Minas Gerais. Tiradentes foi iniciado na maçonaria
pelo poeta e juiz Cruz e Silva, amigo de vários inconfidentes.
Tiradentes teria salvado a vida de Cruz e Silva, não se sabe em que
circunstâncias.
Tiradentes, maçonaria e a Inconfidência Mineira: Como era um simples
alferes (patente igual à de tenente), não lideraria coronéis,
brigadeiros, padres e desembargadores, que eram os verdadeiros líderes
do movimento. Semi-alfabetizado, é muito provável que nunca esteve
plenamente a par dos planos e objetivos do movimento. Em todos os
movimentos libertários acontecidos no Brasil, durante os séculos
XVIII e XIX, era comum o "dedo da maçonaria". E Tiradentes foi maçom,
mas estava longe de acompanhar os maçons envolvidos na Inconfidência,
porque esses eram cultos, e em sua grande parte, estudantes que haviam
recentemente regressado "formados" da cidade de Coimbra, em Portugal.
Uma das evidências documentais da participação da Maçonaria são as
cartas de denúncia existentes nos autos da Devassa, informando que
maçons estavam envolvidos nos conluios.
Os maçons brasileiros foram encorajados na tentativa de libertação,
pela história dos Estados Unidos da América, onde saíram vitoriosos -
mesmo em luta desigual - os maçons norte-americanos George Washington,
Benjamin Franklin e Thomas Jefferson. Também é possivel comprovar a
participação da Maçonaria na Inconfidência Mineira, sob o pavilhão e o
dístico maçônico do Libertas quae sera tamen, que adorna o triângulo
perfeito, com este fragmento de Virgílio (Éclogas,I,27) Tiradentes era
um dos poucos inconfidentes que não tinha família. Tinha apenas uma
filha ilegítima e traçava planos para casar-se com a sobrinha de um
padre chamado Rolim, por motivos econômicos. Ele era, então, de todo o
grupo, aquele considerado como uma "codorna no chão", o mais frágil
dos inconfidentes. Sem família e sem dinheiro, querendo abocanhar as
riquezas do padre. Era o de menor preparo cultural e poucos amigos.
Portanto, a melhor escolha para desempenhar o papel de um bode
expiatório que livraria da morte os verdadeiros chefes.
E foi assim que foi armada a traição, em 15 de março de 1789, com o
Silvério dos Reis indo ao Palácio do governador e denunciando o
Tiradentes. Ele foi preso no Rio de Janeiro, na Cadeia Velha, e seu
julgamento prolongou-se por dois anos. Durante todo o processo, ele
admitiu voluntariamente ser o líder do movimento, porque tinha a
promessa que livrariam a sua cabeça na hipótese de uma condenação por
pena de morte. Em 21 de abril de 1792, com ajuda de companheiros da
maçonaria, foi trocado por um ladrão, o carpinteiro Isidro Gouveia. O
ladrão havia sido condenado à morte em 1790 e assumiu a identidade de
Tiradentes, em troca de ajuda financeira à sua família, oferecida a
ele pela maçonaria. Gouveia foi conduzido ao cadafalso e testemunhas
que presenciaram a sua morte se diziam surpresas porque ele aparentava
ter bem menos que seus 45 anos. No livro, de 1811, de autoria de
Hipólito da Costa ("Narrativa da Perseguição") é documentada a
diferença física de Tiradentes com o que foi executado em 21 de abril
de 1792. O escritor Martim Francisco Ribeiro de Andrada III escreveu
no livro "Contribuindo", de 1921: "Ninguém, por ocasião do suplício,
lhe viu o rosto, e até hoje se discute se ele era feio ou bonito...".
O corpo do ladrão Gouveia foi esquartejado e os pedaços espalhados
pela estrada até Vila Rica (MG), cidade onde o movimento se
desenvolveu. A cabeça não foi encontrada, uma vez que sumiram com ela
para não ser descoberta a farsa. Os demais inconfidentes foram
condenados ao exílio ou absolvidos.
A descoberta da farsa: Há 41 anos (1969), o historiador carioca Marcos
Correa estava em Lisboa quando viu fotocópias de uma lista de presença
na galeria da Assembléia Nacional francesa de 1793. Correa pesquisava
sobre José Bonifácio de Andrada e Silva e acabou encontrando a
assinatura que era o objeto de suas pesquisas. Próximo à assinatura de
José Bonifácio, também aparecia a de um certo Antônio Xavier da Silva.
Correa era funcionário do Banco do Brasil, se formara em grafotécnica
e, por um acaso do destino, havia estudado muito a assinatura de
Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes. Concluiu que as
semelhanças eram impressionantes.
Tiradentes teria embarcado incógnito, com a ajuda dos irmãos maçons,
na nau Golfinho, em agosto de 1792, com destino a Lisboa. Junto com
Tiradentes seguiu sua namorada, conhecida como Perpétua Mineira e os
filhos do ladrão morto Isidro Gouveia. Em uma carta que foi encontrada
na Torre do Tombo, em Lisboa, existe a narração do autor,
desembargador Simão Sardinha, na qual diz ter-se encontrado, na Rua do
Ouro, em dezembro no ano de 1792, com alguém muito parecido com
Tiradentes, a quem conhecera no Brasil, e que ao reconhecê-lo saiu
correndo. Há relatos que 14 anos depois, em 1806, Tiradentes teria
voltado ao Brasil quando abriu uma botica na casa da namorada Perpétua
Mineira, na rua dos Latoeiros (hoje Gonçalves Dias) e que morreu em
1818. Em 1822, Tiradentes foi reconhecido como mártir da Inconfidência
Mineira e, em 1865, proclamado Patrono Cívico da nação brasileira.
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